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Segmento de distribuição de derivados de petróleo sofre com o não pagamento de impostos, desvios, roubos de combustíveis e distorções tributárias 

Os impactos das sonegações e fraudes no segmento de combustíveis foram debatidos no primeiro encontro online do Fórum IBP de Competitividade, realizado nesta quarta-feira (14/7), em parceria com o jornal Valor Econômico. O tema é dos mais sensíveis, em um mercado que arrecada R$ 130 bilhões, fatura R$ 420 bilhões e movimenta cerca de 120 bilhões de litros por ano.

Além disso, é de extrema urgência que a sociedade e agentes de diferentes áreas discutam a questão na busca por medidas que proporcionem mais segurança jurídica e transparência, em um momento crucial da abertura do downstream com a entrada de novos players no refino brasileiro, para que possamos desenhar um novo mercado com maior competição, e com produtos de qualidade e preços justos ao consumidor, segundo os convidados do evento.

Luis Henrique Guimarães, CEO da Cosan, enfatizou a complexidade do arcabouço tributário brasileiro, que facilita a sonegação e o “passeio de produtos” onde se busca otimizar a logística não pela sua eficiência e um menor nível de emissões ao meio ambiente, mas, sim, para usufruir de benefícios fiscais.  Porém, chamou a atenção para três problemas que podem ser combatidos hoje sem a necessidade de se aguardar uma ampla reforma tributária: problemas estes na importação de nafta petroquímica, no uso de liminares para não pagamento de impostos federais da Zona Franca de Manaus (ZFM) e na comercialização de etanol hidratado.

“Na importação da nafta petroquímica algumas empresas desvirtuam o seu destino correto para utilização nas Centrais Petroquímicas, transformam o produto em gasolina e não pagam os impostos da gasolina que são bem maiores do que os da nafta importada – o que gera grande parte dos mais de R$ 14 bilhões não pagos anualmente no setor de combustíveis. O segundo ilícito é o uso da ZFM para a importação de combustíveis (diesel e gasolina) sem o pagamento de impostos federais usando liminares e, por último, na comercialização do etanol hidratado, em que parte do imposto é pago na produção e parte na cadeia de distribuição – diferente do diesel e da gasolina – onde ocorre o fenômeno da chamada “barriga de aluguel”. Neste caso, uma distribuidora vende para outra distribuidora sem pagar imposto – estando a segunda isenta da obrigação – e desaparece do mercado sem arcar com os compromissos devidos”, pontua Guimarães.

O executivo ressaltou também que a questão das diferentes alíquotas do ICMS atrapalha a fiscalização, mas “não é desculpa para ação agora”. Os casos atuais podem ser combatidos rapidamente e retomar os cerca de R$ 14 bilhões para a arrecadação do governo brasileiro”, complementou o CEO da Cosan.

Eduardo Frade, advogado e ex-Superintendente-Geral do Cade, acredita que ações como a adoção da monofasia (cobrança de imposto em um único elo da cadeia), unificação de alíquotas de ICMS nos 27 Estados da Federação, a adoção das alíquotas de ICMS ad rem (reais por litro ou m3), além de um maior engajamento do poder público – especialmente em relação aos devedores contumazes, com a inclusão da cassação de inscrição para operação – são essenciais para aumentar a competitividade do segmento.

Frade pontuou ainda que muitas empresas têm como verdadeiro modelo de negócio não pagar tributos, causando grande distorção no mercado e afetando a competição entre os agentes. “Em um mercado com margem pequena e até 43% do preço final formado por tributos, como no caso da gasolina, se uma empresa não paga esse montante ou parte dele, o seu ganho competitivo em relação aos concorrentes é enorme.”

De acordo com o advogado, em 2008, existiam no Rio de Janeiro 34 distribuidoras de combustíveis, número que caiu para 13 em 2019. “A sonegação e as fraudes causam grande impacto também na revenda. Os que não compram de fraudadores saem em massa do mercado”, afirmou Frade.

Para Fernanda Delgado, pesquisadora da FGV Energia, as sonegações fiscais e as fraudes operacionais geram grande risco social. Ações como roubo de cargas de combustível e derivações clandestinas em dutos, em muitos casos ligados a grupos de crime organizado, afetam não somente o patrimônio das empresas, mas sobretudo conferem grande risco à vida da população. “Isso acarreta prejuízos para transportadoras, caminhoneiros e a expõe a sociedade de forma geral.

Em relação às ações de combate aos desvios e ilícitos que ocorrem no segmento de distribuição, Marco Antonio Reis, Promotor de Justiça, integrante do  Grupo de Atuação Especializada de Combate à Sonegação Fiscal e aos Ilícitos contra a Ordem Tributária do Ministério Público do Rio de Janeiro (GAESF), acredita que a diferenciação de alíquotas de ICMS entre os Estados, com altos valores em alguns deles, é um atrativo para sonegação, assim como a concessão de benefícios fiscais sem a devida fiscalização de contrapartidas e a ausência de um adequado planejamento fiscal.

“É necessária uma nova visualização por parte da justiça e também dos órgãos públicos sobre o poder de polícia administrativa. Como fazer para frear essas fraudes? O cancelamento ou impedimento de inscrições e de benefícios fiscais é um mecanismo possível para frear a perpetuação dessas fraudes. Mas não existe fiscalização tributária sem inteligência. É preciso cruzar os indicadores de geração de emprego e renda após a concessão do benefício fiscal e avaliar sua real eficácia”, acrescentou Marco Reis.

Assista à transmissão na íntegra:

 

A próxima live em parceria com o Valor Econômica será realizada no dia 28 de julho, às 9h, com o tema “Intervenção do Estado na Economia – Desdobramentos sobre os Preços de Derivados”. Mais informações estão disponíveis aqui.